Defensoria Pública diz que itens do Pacote Anticrime do Governo Federal são preocupantes e fere a Constituição

 

O Pacote Anticrime do Ministério da Justiça, elaborado pelo ministro Sérgio Moro, foi tema de discussão em evento promovido pelo Núcleo de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado e Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Sergipe, juntamente com o Observatório da Democracia da Universidade Federal de Sergipe, a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia e Policiais Antifascismo. O debate público foi realizado na noite de quinta-feira, 14, no auditório da Ordem.

 

Defensor Público Sérgio Barreto Morais

O defensor público e diretor do Núcleo de Direitos Humanos, Sérgio Barreto Morais, disse que o projeto traz questões extremamente polêmicas. “É um pacote que propõe um combate à criminalidade fora da Constituição Brasileira. É preciso esclarecer que ninguém tem pacto com a impunidade e criminalidade, afinal, nossa bandeira é também de combate, mas o que exigimos é que tudo seja feito dentro da Constituição”, frisa.

Para o membro da Defensoria Pública, existem itens no projeto que preocupam a instituição. “No projeto têm artigos de prisões automáticas, ou seja, em segunda instância decretada automaticamente.  É uma sentença condenatória que será decretada automaticamente e, excepcionalmente, o juiz, considerando uma motivação excepcional, poderá manter a liberdade.  Segundo a constituição, a regra é a liberdade e excepcionalmente a prisão, mas o projeto deturpa, subverte esta regra para tornar a prisão como regra e, excepcionalmente, a liberdade”, explica.

Outros itens contestados pelo defensor público são: a condenação no tribunal do Júri, onde o acusado já sai preso naquele momento ainda com o caso sob judice;  criação do Banco Nacional de perfil genético de acusados e condenados por crimes dolosos; gravação em presídios federais de acusados e advogados, além de gravações  ambientais nos pátios dos presídios. “São medidas muito preocupantes que trarão grandes consequências de uma despolítica do governo. Quem sofrerá com isso é a comunidade pobre, os negros, as pessoas LGBTs, enfim, o público da Defensoria, pois nós atendemos todos os dias essas pessoas, por isso, estamos muito preocupamos com esse Pacote Anticrime”, disse Sérgio Barreto.

Segundo Barreto, o projeto não trará resultado prático. “O que vai haver é um combate tosco à criminalidade e que não trará resultados práticos. Hoje temos a quarta população carcerária do mundo com 800 mil presos e, com essa política, passaremos de um milhão de presos que serão, na sua grande maioria, de negros, pobres e LGBTS. Maioria dos itens do projeto fere a Constituição Brasileira” lamenta.

De acordo com a conselheira da OAB/SE e representante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, Izadora Gama Brito, o projeto tem muitas brechas. “Existe um direcionamento para atingir pessoas que são reincidentes e um viés de saída que fica a critério do julgador para quem tem bons antecedentes e escolaridade. É um projeto que vai atingir a população periférica e negra – a mesma que enche os presídios – e que não combate efetivamente a corrupção, o crime eleitoral e o crime organizado. A preocupação maior é a legítima defesa, que pode ser por medo ou susto, ou seja, existe um critério muito vago. Se aprovado, haverá consequentemente um número absurdo de prisões e sabemos que o encarceramento em massa não é a solução para a violência”, enfatiza.

 

Presidente da Adpese, Defensor Público Herick Argôlo

Quanto à atuação da Defensoria Pública na discussão do tema, Izadora é enfática: “A Defensoria Pública é o acolhimento de primeira hora da população carente. Ter a instituição no debate é muito importante porque é algo que vive no dia a dia e é a que vai sentir mais as consequências do projeto. A Defensoria tem um papel fantástico, um posicionamento atuante, firme, além de ser muito respeitada no Estado”, destaca.

O coordenador do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), Roberto Silveira, afirmou que o Pacote Anticrime vai agravar o encarceramento em massa. “Existem pontos no projeto que acreditamos que são inconstitucionais. De uma forma geral, a própria medida penal sem estudo de impacto social visa uma situação de agravamento no sistema carcerário brasileiro, e, sobretudo, a questão da própria situação dos negros, o que nos preocupa. Precisamos combater toda e qualquer atitude que venha a agravar o sistema penal”, conclama.

 

Conselheira da OAB/SE e representante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, Izadora Gama Brito

Representando a Polícia Federal em Sergipe, o delegado Carlos César Pereira de Melo disse que o projeto vem com um viés propositivo e de melhorar a sensação de impunidade. “A Polícia Federal pode contribuir com pontos positivos do projeto como o rigor na execução da pena, informante do bem, delação, não lavratura do auto de prisão em flagrante quando o sujeito se encontrar nas condições de legítima defesa de acordo com o art. 23 do Código Penal, e policial disfarçado. São várias oportunidades em que a polícia entende que o Pacote Anticrime é importante, um avanço para a sociedade e que veio em boa hora, mas têm oportunidades de melhorias que permitirão várias discussões que findarão em um texto em que a sociedade entenderá como o melhor para o momento atual”, salienta.

 

Delegado da PF, Carlos César Pereira de Melo

Carta de São Paulo – Segundo o coordenador do IBCCRIM, Roberto Silveira, diversas instituições estão participando da elaboração da Carta de São Paulo. “É uma carta que está sendo escrita pelas Defensorias Públicas dos estados de São Paulo e Rio de Janeiro que contempla e considera inconstitucional 19 eixos centrais do Pacote Anticrime. É importante frisar que estaremos abordando os itens de ordem prepositiva e não contrária, afinal, não estamos julgando o governo Bolsonaro e qualquer outra atitude governamental, mas contestando itens e primando pela nossa Constituição”, ressalta.

 

O evento contou com a participação dos defensores públicos Daniel Faria, Marcos Palmeira, Juliana Falcão e do presidente da Associação dos Defensores Públicos (Adpese), Herick Argôlo.

Coordenador do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), Roberto Silveira

Scroll to Top
Pular para o conteúdo